Cho Jang-hun se lembra de uma época na década de 1990 em que era quase impossível escapar do ar sujo da fumaça de escapamentos, usinas elétricas movidas a carvão e grandes projetos industriais que pairavam sobre a casa dele em Gyeonggi, República da Coreia.
A fumaça costumava ser tão ruim que as golas da camisa branca que Cho usava pela manhã ficavam pretas com fuligem à noite.
Mas, nos últimos anos, o professor de 47 anos notou uma redução acentuada na poluição do ar que antes atormentava Gyeonggi, que, junto a Seul e Incheon, forma a região metropolitana de Seul.
"O ar está muito mais saudável e o céu, limpo", disse.
Dados publicados em um relatório recente do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA) sobre a qualidade do ar na metrópole comprovam isso. Foi descoberto que as concentrações dos poluentes atmosféricos mais prejudiciais, como material particulado (MP), excederam em muito os padrões nacionais e as diretrizes de qualidade do ar da Organização Mundial da Saúde (OMS) em 2005, mas caíram significativamente em 2020.
Quando inalado, o material particulado – minúsculas partículas invisíveis transportadas pelo ar – pode penetrar profundamente nos pulmões e entrar na corrente sanguínea, causando doenças cardíacas, derrames cerebrais e problemas respiratórios.
O relatório descobriu que as concentrações médias anuais de material particulado menores que 10 micrômetros (PM10) foram de 30% a 40% menores em 2021 em comparação a 2005. Em toda a República da Coreia, as emissões de PM2.5 caíram 19% entre 2005 e 2020, com reduções ainda maiores em Seul e Gyeonggi.
A melhoria na qualidade do ar de Seul é resultado de décadas de trabalho do governo da República da Coreia para combater a poluição do ar, que causa cerca de 7 milhões de vidas em todo o mundo todos os anos. Sua abordagem é vista como uma história de sucesso na região da Ásia-Pacífico, onde 92% da população, cerca de 4 bilhões de pessoas, respira ar insalubre, com risco de danos ao coração, pulmões e cérebro.
Uma receita para um ar mais limpo
A região metropolitana de Seul abriga 26 milhões de pessoas, cerca de metade da população da República da Coreia.
A região, um dos principais impulsionadores da economia do país, foi responsável por 48% do Produto Interno Bruto nacional em 2016, de acordo com o Banco Mundial. Todavia, grande parte da atividade econômica que o torna uma potência levou ao aumento do transporte, da indústria, da produção de resíduos e eletricidade, que muitas vezes contribuem para uma maior poluição do ar.
Nas últimas duas décadas, o governo respondeu criando uma estrutura legal robusta para gerenciar a qualidade do ar na região metropolitana de Seul. Também disponibilizou publicamente dados de longo prazo sobre a qualidade do ar e investiu fortemente em sistemas de gestão da qualidade do ar, entre outras medidas fundamentais.
O marco regulatório da qualidade do ar na República da Coreia consiste em múltiplos níveis de planejamento e elaboração de políticas. Um ato governamental serve como uma estrutura abrangente a nível nacional. Enquanto isso, planos distintos delineiam como o ato será implementado nos níveis nacional e local.
"A legislação de qualidade do ar fornece uma base sólida para ações para combater a poluição do ar na região metropolitana de Seul", disse Mushtaq Memon, coordenador de Produtos Químicos e Ação de Poluição do PNUMA para a Ásia e o Pacífico. "Tem sido particularmente eficaz porque identifica os papéis e responsabilidades de diferentes organizações a níveis nacional e subnacional. Isso criou clareza sobre quem é responsável por implementar diferentes componentes da gestão da qualidade do ar."
Para avaliar a conformidade com o quadro legal, foram criados centenas de locais de monitoramento que fornecem dados sobre a poluição atmosférica em toda a região metropolitana de Seul e em outros pontos da República da Coreia. Os dados estão disponíveis publicamente por meio de um site de informações sobre a qualidade do ar em tempo real, que permite aos pesquisadores identificar tendências e fornecer informações sobre quais agências governamentais podem agir.
Investimentos substanciais têm sido fundamentais para melhorar a qualidade do ar. Entre 2007 e 2020, os governos de Seul, Incheon e Gyeonggi investiram US$ 9 bilhões na gestão da qualidade do ar, com 56% do financiamento concentrado em medidas para reduzir as emissões do setor de transportes. Cerca de US$ 3,2 bilhões também foram destinados à geração de evidências e ao engajamento público em relação à qualidade do ar.
"O investimento sustentado para enfrentar as mudanças climáticas e, simultaneamente, melhorar a qualidade do ar será fundamental daqui para frente." (Cho Kyung-doo, diretor geral do Centro de Neutralidade de Carbono de Incheon)
Além disso, os governos da região metropolitana de Seul introduziram uma série de políticas para lidar com a poluição do ar nos últimos anos. Elas incluem a instalação obrigatória de caldeiras ecológicas nas residências, restrições à condução de veículos emissores de poluentes e a ecologização das frotas de transporte público.
O ar mais limpo trouxe resultados positivos para a saúde humana. Entre 2006 e 2015, estima-se que o número de mortes prematuras associadas à exposição à poluição do ar tenha caído substancialmente em Seul, Incheon e Gyeonggi, de acordo com um estudo.
Necessidade de abordar conjuntamente a poluição do ar e as mudanças climáticas
Melhorar a qualidade do ar é fundamental para enfrentar a tripla crise planetária das mudanças climáticas, da perda da natureza e biodiversidade, da poluição e dos resíduos. A poluição do ar não só reduz a biodiversidade mundial, como também é um fator-chave na desestabilização do clima global.
Apesar do progresso da região metropolitana de Seul na qualidade do ar, a liberação de dióxido de carbono que aquece o planeta continua sendo um problema persistente.
O PNUMA e a Coalizão Clima e Ar Limpo identificaram 25 soluções baseadas na ciência para proporcionar ganhos para o clima e a poluição na região da Ásia-Pacífico. Essas incluem a transição de combustíveis fósseis para fontes de energia renováveis e a melhoria da eficiência energética no transporte e na indústria. A República da Coreia reconheceu que essas medidas serão fundamentais para que o país atinja a sua meta de neutralidade de carbono até 2050.
Os governos da região metropolitana de Seul já estão adotando essa nova direção.
"Embora as pesquisas anteriores tenham enfocado principalmente na melhoria da qualidade do ar, os estudos atuais visam alcançar tanto benefícios para a saúde quanto transições energéticas por meio da neutralidade de carbono", disse Cho Kyung-doo, diretor geral do Centro de Neutralidade de Carbono de Incheon. "O investimento constante para enfrentar as mudanças climáticas e melhorar a qualidade do ar simultaneamente será fundamental daqui para frente."
Integrar as agendas de poluição e clima é uma oportunidade crucial para beneficiar as saúdes humana e planetária em cidades e regiões em todo o mundo.
Suh Jeom-sook, líder da equipe da Divisão de Política de Qualidade do Ar do Governo Metropolitano de Seul, acredita que o sucesso da região pode inspirar outras pessoas.
"Vimos o que é possível com as políticas certas e esforços dedicados de atores em toda a região metropolitana de Seul e estamos entusiasmados com o trabalho à frente para melhorar ainda mais o ar que compartilhamos", disse ela. "Esperamos que nossas experiências possam servir como um exemplo positivo para os governos da Ásia-Pacífico e de todo o mundo na pressão por ar limpo e céu azul."
Para combater o impacto generalizado da poluição na sociedade, o PNUMA lançou a #CombataAPoluição, uma estratégia para uma ação rápida, em larga escala e coordenada contra a poluição do ar, da terra e da água. A estratégia destaca o impacto da poluição nas mudanças climáticas, na perda da natureza e da biodiversidade e na saúde humana. Por meio de mensagens baseadas na ciência, a campanha mostra como a transição para um planeta livre de poluição é vital para as gerações futuras.
